- CUIABÁ
- QUINTA-FEIRA, 27 , NOVEMBRO 2025


A confirmação, pelo ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de que autorizou a CIA a atuar contra o governo da Venezuela acendeu um alerta entre especialistas em relações internacionais. Estudiosos ouvidos pela Agência Brasil avaliam que a medida representa um grave precedente, podendo justificar futuras intervenções militares americanas em países da América Latina.
Segundo eles, a ação viola o direito internacional, ameaça a soberania de nações da região e coloca em risco a estabilidade do continente, especialmente de países vizinhos como o Brasil. Para os especialistas, a alegação oficial da Casa Branca — de que a intervenção visa combater o narcotráfico — esconde o verdadeiro interesse: o controle das maiores reservas de petróleo do mundo, localizadas em território venezuelano.
“O impacto é catastrófico para a região. Não sabemos se os EUA vão parar na Venezuela. A intenção é transformar o país em um protetorado e colocar no poder quem eles desejam”, afirmou Roberto Goulart Menezes, professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB).
A professora Camila Vidal, da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), reforça que a intervenção é ilegal e representa um risco direto à soberania dos países vizinhos. “A Venezuela não é uma ameaça aos EUA. O problema é que tem uma política externa autônoma, que não se submete a Washington. Isso nunca foi tolerado na América Latina”, pontuou.
Risco de guerra civil e desestabilização regional
O historiador e pesquisador de conflitos armados Rodolfo Queiroz Laterza alerta para o risco de uma guerra civil caso o presidente Nicolás Maduro seja deposto. “Isso pode desencadear uma polarização extrema, com aumento da violência interna e fluxo migratório em massa para países vizinhos, como o Brasil”, disse.
Segundo ele, a estratégia norte-americana se enquadra como uma “guerra híbrida”, com potencial de ser replicada em qualquer país da América Latina que entre em rota de colisão com os interesses de Washington.
Em setembro, a maioria dos países latino-americanos expressou preocupação com o aumento da presença militar dos EUA no Caribe. A tensão se intensificou após Trump admitir, em coletiva recente, que autorizou ações diretas da CIA contra o governo de Maduro. Em 2023, ele já havia declarado que teria “tomado a Venezuela e pegado o petróleo” caso tivesse vencido a eleição presidencial de 2020.
Geopolítica do petróleo
A Venezuela possui cerca de 320 bilhões de barris de petróleo, o que a torna alvo estratégico na geopolítica energética mundial. Para os especialistas, esse é o verdadeiro motivo por trás das ações americanas.
“O que está em jogo é o acesso a essa riqueza. A justificativa do combate às drogas é apenas uma fachada. Assim como foi com as armas de destruição em massa no Iraque, agora o pretexto são os cartéis, que nem mesmo existem de forma estruturada na Venezuela”, afirmou Laterza.
Relações históricas conturbadas
As tensões entre Caracas e Washington não são recentes. Desde que Hugo Chávez chegou ao poder, em 1999, os dois países mantêm uma relação marcada por desconfiança e intervenções indiretas. Em 2002, Chávez foi deposto por um breve golpe de Estado, revertido por militares leais. Em 2019, os EUA reconheceram o deputado Juan Guaidó como presidente interino e impuseram um embargo ao petróleo venezuelano.
Apesar de uma breve flexibilização após a guerra na Ucrânia, as sanções voltaram a se intensificar com a reeleição de Trump em 2024. A situação se agravou após a reeleição de Nicolás Maduro, em julho, em eleições contestadas por diversos observadores internacionais.