- CUIABÁ
- SEGUNDA-FEIRA, 28 , JULHO 2025
O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apresentou, nesta quinta-feira (17), uma proposta de reforma tributária que sugere a criação de um Imposto Global Mínimo de 14% sobre a renda de pessoas físicas que recebem mais de R$ 50 mil por mês. A medida permitiria isentar do Imposto de Renda aqueles que ganham até R$ 5 mil mensais.
A proposta consta na nova edição da Carta de Conjuntura do instituto e representa uma alternativa mais ambiciosa em relação ao Projeto de Lei (PL) 1087/2025, enviado pelo governo ao Congresso Nacional. O PL prevê uma alíquota progressiva de até 10% para quem recebe acima de R$ 600 mil por ano (R$ 50 mil por mês), com a taxa máxima reservada para os chamados “super-ricos” — contribuintes com renda anual superior a R$ 1,2 milhão (cerca de 0,7% da população).
Tributação proporcional e sobre toda a renda
Segundo o estudo, assinado pelo técnico de planejamento e pesquisa Pedro Humberto Carvalho, a alíquota de 14% tem como base a tributação efetiva máxima observada em 2022 — paga por contribuintes com renda mensal de R$ 16 mil — e deve ser aplicada sobre toda a renda, incluindo fontes hoje isentas, como dividendos, reembolsos, restituições, bônus, prêmios de seguro e auxílios.
“A proposta que eu faço difere do PL porque considera a renda total do contribuinte, sem exclusões de auxílios, reembolsos ou benefícios salariais indiretos, que hoje reduzem a base de cálculo”, explica Carvalho.
Contribuições previdenciárias entram no cálculo
O estudo também inova ao incluir as contribuições previdenciárias (CPs) oficiais na base de cálculo da carga tributária sobre a renda. Segundo Carvalho, esse fator é essencial para compreender a regressividade do sistema atual.
“O valor de 14% é superior à proposta do governo porque inclui não só o imposto de renda, mas também a contribuição previdenciária, que tem um impacto desproporcional sobre os mais pobres”, afirma. Ele destaca que o teto previdenciário, atualmente em torno de R$ 8 mil, significa que quem ganha acima disso paga o mesmo valor de contribuição, independentemente da renda.
A Carta de Conjuntura ressalta que o atual modelo previdenciário brasileiro enfrenta um déficit expressivo e que as CPs, apesar de sua finalidade contributiva, assumem caráter tributário, já que os benefícios futuros não estão diretamente vinculados ao montante recolhido.
Impacto fiscal
Caso implementada, a proposta do Ipea poderia gerar uma arrecadação adicional de até R$ 145,6 bilhões, o que representaria um aumento de cerca de 40% na receita do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF) em 2024. A arrecadação subiria dos atuais 3,1% para 4,3% do Produto Interno Bruto (PIB), aproximando-se de países como Polônia, Eslováquia e Uruguai, embora ainda abaixo da média de 8,5% da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Críticas ao projeto de lei atual
O estudo aponta limitações importantes no projeto de lei apresentado pelo governo. Segundo Carvalho, mesmo com a nova proposta, os mais ricos continuariam pagando proporcionalmente menos impostos do que a classe média.
“Hoje, os mais ricos pagam quase nada. Mesmo com o PL, pagarão 10%, enquanto a classe média já arca, em média, com 14%. A proposta apenas atenua a desigualdade, mas não a corrige. Por isso, defendo uma alíquota de 14% para os mais ricos”, argumenta.
Riscos e desafios
A proposta também alerta para três riscos que precisam ser considerados na reformulação do sistema:
Fuga de domicílio fiscal: A tributação mais elevada pode levar os mais ricos a transferirem sua residência fiscal para países com menor carga tributária.
Supertributação de lucros empresariais: O estudo aponta o risco de sobrecarga na tributação de lucros de pessoas jurídicas.
Regressividade horizontal e vertical: A atual estrutura de deduções e isenções em itens como fundos de pensão, aluguéis e despesas médicas favorece os mais ricos.
Soluções sugeridas
Para evitar a evasão fiscal, o Ipea propõe a implementação de um “imposto de saída”, com tributação de 25% sobre ganhos de capital não realizados ou, alternativamente, uma taxa de 3% sobre o patrimônio. Medidas semelhantes já são aplicadas em países da OCDE, como Estados Unidos, França, Alemanha e Suécia.
Quanto às deduções médicas, a carta sugere o estabelecimento de um teto e a substituição parcial por um crédito tributário fixo, igualitário e, possivelmente, vinculado à idade. Essa mudança também permitiria a inclusão de gastos com medicamentos, o que beneficiaria especialmente usuários do Sistema Único de Saúde (SUS).
Em 2024, as deduções médicas representaram uma renúncia fiscal de R$ 26,7 bilhões. Os 5% mais ricos concentraram 22,4% desse total, evidenciando o caráter regressivo da atual política de deduções.
Conclusão
A proposta do Ipea se alinha à defesa feita pelo Brasil na presidência do G20 de um imposto mínimo global para os mais ricos. O estudo conclui que uma reforma ampla e justa do IRPF é essencial para corrigir distorções históricas do sistema tributário brasileiro e garantir maior equidade fiscal.